Abstract: | As sucessões neoproterozóicas do Cráton do São Francisco são constituídas por espessas camadas
carbonáticas e siliciclásticas, acumuladas em bacias marinhas intracratônicas (epicontinentais) e em bacias
de margem passiva, que bordejam a área cratônica. Estas sucessões formam os grupos Bambuí e Una (bacias
intracratônicas), alem dos grupos Vaza Barris/Miaba, Riacho do Pontal, Rio Preto, Rio Pardo, Macaubas e
parte do que foi denominado Grupo Vazante (bacias de margem passiva). Todas mostram, nas suas unidades
basais, evidências claras (diamictitos glacio-marinhos) ou indiretas (excursões negativas de δ13C ou outras)
de eventos glaciais, provavelmente relacionados à glaciação Sturtiana, de caráter global (entre 750 e 700
Ma.). Alem disso, um segundo evento glacial, possivelmente relacionado à glaciação Marinoana (entre 650 e
600 Ma.), pode estar representado em algumas dessas sucessões.
Os depósitos de fosfato (fosforitos) que ocorrem nas bacias sedimentares Neoproterozóicas do
Cráton do São Francisco estão relacionadas a eventos de fosfatização global que ocorreram durante o final
do Eon Proterozóico. Esses depósitos ocorrem em horizontes estratigráficos bem definidos das sucessões
carbonáticas dos Grupos Bambuí e Una e da parte basal da sucessão até aqui denominada de Grupo Vazante.
O estudo desses depósitos é de grande importância, não somente pelas implicações econômicas, mas também
por se considerar a possibilidade de interpretações paleo-ambientais, a partir do uso de isótopos estáveis
(carbono, oxigênio e enxofre), assinaturas isotópicas de razões 87Sr/86Sr e padrões de ETR, além de outras,
em carbonato-fluorapatita ou francolita, o principal componente mineralógico de fosforitos primários, pouco
ou nada intemperizados.
Neste trabalho foram estudados os fosforitos de Lagamar, Rocinha (Grupo Vazante) e Irecê (Grupo
Una), comparativamente. Foram feitos levantamentos de campo, amostragem e análises isotópicas de Sr, C,
O e S e ETR em carbonato-fluorapatita (CFA), alem de datações Pb-Pb e determinações isotópicas de Sm-
Nd. Todas as amostras foram devidamente purificadas.
As razões 87Sr/86Sr obtidas para os fosfato de Lagamar e Rocinha (melhor preservadas, com Sr total
> 1000 ppm e razão Mn/Sr < 0,5 ppm), variaram em torno de 0,70760 e 0,70791, ou seja, dentro da faixa
esperada para o intervalo próximo a 650 Ma (Criogeniano superior) na curva de variação da razão 87Sr/86Sr
durante o Neoproterozóico e Cambriano. Com relação ao depósito de Irecê, todos os dados obtidos a partir
das amostras de CFA mostram valores muito elevados de 87Sr/86Sr, com exceção de uma amostra de micrita
associada ao CFA com excelente grau de preservação (Sr = 2384 ppm e Mn/Sr = 0,03) - cujo valor
(0,70752) está próximo, porem ligeiramente abaixo do limite mínimo da faixa obtida para Rocinha e
Lagamar, o que pode significar que se trata de um evento um pouco mais antigo, possivelmente relacionado
ao Criogeniano Médio. Valores de δ13C obtidos em todas as amostras estão situados entre +7,40 e -8,54‰
VPDB, valores esses que caem na faixa de idade entre 700 e 600 Ma., quando lançados na curva de evolução
durante o Neoproterozóico-Cambriano.
Os resultados de δ13C negativos para o CFA sugerem ambientes sub-óxicos a anóxicos na sua
formação, hipótese reforçada pelos valores elevados de δ34S obtidos em três amostras, provenientes de Irecê
e Lagamar: 29,9 e 30,1 ‰ V-CDT (Irecê) e 64,6 ‰ V-CDT (Lagamar). Estes valores, quando lançados sobre
a curva de evolução de δ34S para água do mar de Claypool et al. (1980), permitem também colocar os
depósitos de fosforito estudados numa faixa de idade entre 600 e 650 Ma.
Os demais dados (ETR, Pb-Pb e Sm-Nd), incluindo as observações de campo, conduzem a validar as
interpretações acima. Com base nesses dados e em datações Re-Os realizadas recentemente por outros
autores em folhelhos orgânicos da parte superior do Grupo Vazante (1.3 a 1.1 Ga), e a partir de mapeamento
na escala 1:100.000 concluído pela equipe da CPRM de Belo Horizonte em 2011, foi possível a formulação
de uma nova organização estratigráfica para o Grupo Vazante, que está sendo colocada em discussão desde
2009. A parte inferior (Formação Rocinha) poderia se correlacionar à Formação Serra da Saudade (Grupo
Bambuí) e a parte superior, mais antiga, é alóctone e colocada naquela posição pela falha de Lagamar (falha
de empurrão).
Se corretas as correlações propostas e os processos fosfogenéticos envolvidos, novas perspectivas
certamente se abrirão para exploração mineral de fosfato nas bacias neoproterozóicas. |